TST reconhece abuso e condena empresa que cobrou por mensagens de WhatsApp após o expediente

A 3ª Turma do TST fixou que cobrar metas por WhatsApp fora do horário invade a vida privada e gera indenização por dano moral. Veja critérios, casos recentes e o avanço do direito à desconexão no Brasil.
Trabalhar conectado virou regra, mas a Justiça do Trabalho tem imposto limites. Em decisão paradigmática, a 3ª Turma do TST condenou uma empresa por cobrar metas via WhatsApp fora do expediente, por entender que a prática extrapola o poder do empregador e afeta o equilíbrio psicológico do empregado. O caso segue como referência para situações semelhantes em todo o país.
O julgamento envolveu um vendedor de telefonia e resultou em indenização por dano moral. O relator, ministro Alexandre Agra Belmonte, destacou que a cobrança após o expediente invade a vida privada e gera angústia e apreensão. O processo ficou registrado como TST-RR-10377-55.2017.5.03.0186, com acórdão assinado em 17/10/2018.
Veículos jurídicos e de imprensa repercutiram a condenação, descrevendo a conduta como abusiva e confirmando o valor indenizatório aplicado no caso concreto. A partir daí, “WhatsApp fora do expediente” virou expressão recorrente em ações e defesas trabalhistas.
Ao mesmo tempo, decisões mais recentes vêm refinando o debate, ora reconhecendo horas extras quando a troca de mensagens prolonga a jornada, ora afastando esse direito quando não há exigência ou habitualidade. O tema hoje se resolve por prova concreta e contexto.
O que a decisão do TST diz sobre WhatsApp e dano moral
O TST entendeu que cobrar metas por mensagens após o expediente extrapola o poder diretivo. A conduta viola o direito ao descanso e interfere na saúde mental, fundamento para dano moral. O precedente vincula a análise a elementos como frequência das cobranças, tom das mensagens e impacto na vida do empregado.
No acórdão, o Tribunal registra que, se não há necessidade urgente, a orientação deve aguardar o horário de trabalho. “Se não era para responder, por que mandar o WhatsApp?”, questiona o voto, ao reforçar o limite entre o legítimo poder de comando e o abuso.
A condenação ocorreu em 2018, mas segue atual como baliza. Ela é frequentemente citada por tribunais regionais e por doutrina quando se discute o direito à desconexão, consolidando um entendimento que privilegia o repouso e a privacidade.
Para o leitor, o recado é claro: mensagens de cobrança fora do expediente podem gerar indenização mesmo sem aumento de jornada, quando atingem a esfera íntima do trabalhador.
Quando mensagens viram hora extra e quando não
Há decisões que reconhecem hora extra quando o empregado fica à disposição respondendo grupos ou superiores com habitualidade após o ponto. Em junho de 2025, a 2ª Vara do Trabalho de Limeira (SP) mandou pagar diferenças a uma funcionária que interagia em grupos até 20h40, comprovando sobrejornada.
Por outro lado, há julgados que afastam a hora extra quando o uso do WhatsApp não é obrigatório, não há controle de jornada ou a participação é esporádica. Em 2022, o TRT-3 rejeitou o pedido de um trabalhador que participava de grupo de aplicativo, por entender que não havia imposição de disponibilidade após o expediente.
O ponto-chave é prova: frequência, conteúdo das mensagens, ordens diretas, prazos e o impacto sobre o descanso. Prints, registros de horário e testemunhas ajudam a formar o convencimento do juiz. Proatividade processual faz diferença.
Em síntese: dano moral e hora extra podem coexistir, mas têm fundamentos distintos. O primeiro trata da violação à dignidade e privacidade; o segundo exige demonstração de trabalho efetivo ou tempo à disposição.
Direito à desconexão: o que já vale e o que falta na lei
O direito à desconexão está cada vez mais presente na jurisprudência. Em outubro de 2024, o TRT-4 reconheceu danos morais por violação desse direito, reforçando a proteção ao descanso. A doutrina trabalhista também trata o tema como pilar de saúde e segurança no trabalho digital.
Não há lei específica em vigor que regulamente a desconexão no Brasil. Tramita no Senado o PL 4.044/2020, que conceitua o instituto e prevê limites de contato fora do expediente, inclusive com contagem como horas extraordinárias em hipóteses excepcionais. O projeto segue em debate.
Estudos acadêmicos e relatórios de tribunais defendem a positivação do tema para reduzir insegurança jurídica, padronizar políticas internas e prevenir litígios. Até lá, a proteção decorre da CLT, da Constituição e da jurisprudência reiterada.
Para empresas, o risco é duplo: passivo por horas extras e indenizações por violação à privacidade. Para trabalhadores, a orientação é documentar abusos e guardar provas sem expor dados sensíveis.
Boas práticas imediatas para evitar passivos
Defina política de comunicação: horários, canais e regras para contatos urgentes. Formalize em regulamento interno e treine lideranças. Isso reduz alegações de abuso e mostra compliance.
Ative recursos de silenciar notificações e respostas automáticas fora do expediente em grupos corporativos. Urgências reais devem ser raras, justificadas e registradas para fins de hora extra.
No teletrabalho, combine janelas de disponibilidade e proíba “microcobranças” em horários de descanso. Políticas claras valem mais que lembretes informais.
Audite rotinas de gestão: a insistência em “só um minutinho” após o expediente tende a virar prova de sobrejornada e de assédio organizacional, com custo alto no contencioso.
Quer opinar? É aceitável que chefias usem o WhatsApp à noite para “adiantar o dia seguinte”? Você defenderia bloqueio técnico de mensagens fora do expediente ou autorregulação basta? Deixe seu comentário e explique como sua empresa lida com isso hoje.
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